A HISTÓRIA MARAVILHOSA DE PETER SCHLEMIHL


A certa altura de seu romance Ilusões perdidas, Balzac refere-se a uma obra então muito difundida entre jovens parisienses “ávidos por leituras e desprovidos de dinheiro”. Trata-se da misteriosa narrativa que se apresenta aqui ao leitor brasileiro, a qual Thomas Mann caracterizou como “novela fantástica”, apoiando-se certamente na breve definição formulada por Goethe em 1827: “Pois que outra coisa é a novela senão um acontecimento inaudito?”.

Em torno de um episódio dos mais peculiares (a troca da sombra por uma inesgotável “bolsa da fortuna”), Chamisso elaborou uma história que, desde a sua publicação em 1814, vem suscitando as mais variadas interpretações. Pois o que significa propriamente essa sombra que o ambicioso Schlemihl cede ao “maligno” e cuja falta o faz mergulhar na mais profunda miséria humana, que ele só consegue superar — agora então como botânico — mediante um retorno à natureza de caráter maravilhoso, mas também tipicamente rousseauniano? Simbolizaria a ausência de sombra uma condição vivenciada pelo próprio Chamisso, a do homem sem pátria e sem raízes? Estaria a sombra figurando a solidez burguesa, o prestígio social calcado na aparência? Seria ela enfim uma espécie de “alma exterior”, para recorrer aqui à famosa teoria esboçada por Machado de Assis no conto “O espelho”?

O leitor perceberá que é a própria impossibilidade de apreender conceitualmente o significado profundo dessa novela que lhe confere o fascínio imorredouro, testemunhado por artistas como E.T.A. Hoffmann, Heine, Balzac, Kafka, Thomas Mann, entre vários outros. 


                                                                                                   


CHAMISSO

Nasce como Louis Charles Adelaide de Chamisso de Boncourt em 1781, no castelo de Boncourt, na região da Champagne, França. Exila-se em Berlim durante a Revolução Francesa, que arruinou sua família, e lá,depois de servir no exército prussiano por mais de dez anos.