ENSAIO SOBRE O LOUCO POR COGUMELOS



Logo de início, Peter Handke anuncia o tom: “Está ­ficando sério de novo!”, diz o protagonista, alter ego bem pouco dissimulado e crítico mordaz do próprio escritor. Nesse jogo de duplo espelho em que o ensejo é saber o quanto há da persona Handke em cada trecho, fato é que temos aqui o último — embora com o Prêmio Nobel de 2019 nunca se sabe ao certo — ensaio autorretratado da série de cinco. O confronto com a escrita percorre e traspassa a série e chega aqui a bom porto, não sem sua carga de ironia e sarcasmo, finamente moldada pelos anos.

Handke parodia a si mesmo, faz circunvoluções em torno do escrever e do não conseguir escrever (tão importante quanto), camuflando-se sob as abas de efêmeros cogumelos brotando (como a escrita?) em florestas encantadas. Brotam selvagens e resistentes, contra ventos e intempéries — a metáfora com a escrita nunca é fortuita. Fato é que Handke ou seu irrequieto farejador dos bosques encara todas as dificuldades de mundo em cumprir a meta de escrever um compêndio micológico. O todo em meio a considerações múltiplas, por vezes saborosamente alucinógenas, em que o alterno handkeano cai em reflexão precisa e condoída sobre o que vem a ser a criação literária, e nisso o romancista, dramaturgo, ensaísta e roteirista austríaco é mestre inconteste.

E por falar em devaneio, que tal termos aqui um advogado de tribunal internacional (de Haia?) no papel de sábio bufão colhendo seus preciosos fungos de terno gravata? Em Handke, ao fim e ao cabo tudo tem sua razão e nada é gratuito.



OBRA DISPONÍVEL TAMBÉM EM E-BOOK

                                                                                                   



PETER HANDKE


Peter Handke, nascido em 1942, é austríaco de mãe eslovena, e vive hoje em Chaville, nos arredores de Paris. Está entre os mais importantes escritores e dramaturgos de língua alemã. Recria sem cessar sua escrita e se recoloca sempre como autor.

Handke publicou dezenas de obras, entre elas várias que marcaram época, como a peça Kaspar (1968), as novelas ensaísticas como Tarde de um escritor (1987), a série de Ensaios e os romances A mulher canhota (1976), Numa noite escura, deixei minha casa silenciosa (1997) e A noite moraviana (2008). Com Wim Wenders, assinou os roteiros de O medo do goleiro ante o pênalti (1972) e Asas do desejo (1987). Dirigiu ele mesmo uma versão cinematográfica de A mulher canhota. Em 2019, foi laureado com o Prêmio Nobel de Literatura. Dele, esta editora publicou Don Juan (narrado por ele mesmo), em 2007, A perda da imagem ou Através da Sierra de Gredos, em 2009, Ensaio sobre a jukebox e Ensaio sobre o louco por cogumelos, ambos em 2019, e, em 2020, Ensaio sobre o dia exitoso e Ensaio sobre o cansaço. Em 2023, será publicado o basilar Meu ano na baía de ninguém.




Livro
Tradutor Augusto Rodrigues
Formato 14x20cm
Páginas 160
ISBN 978-85-7448-278-1

Escreva um comentário

Você deve acessar ou cadastrar-se para comentar.